quinta-feira, maio 19, 2005

O OVNI

Há mais de 20 anos que o Juvenal fazia aquele caminho e sempre à mesma hora – entre as duas e as três da manhã. Fazia o turno das 18 às 2 horas na fábrica de lacticínios, quase desde que se lembrava e, num desfiar de um rosário interminável, todos os dias, menos à terça-feira, fazia aquele caminho de regresso a casa. Muita gente lhe dizia para ele ter cuidado, que os tempos agora eram diferentes, mas ele nunca se desfez da sua Zundapp e esta continuava a ser a sua companheira de sempre. A sua cor amarela há muito tinha desaparecido e, atrás, um caixote da fruta, de madeira, preso por esticadores, permitiam-lhe transportar pequenos volumes, em especial os três litros de leite do dia, a que tinha direito, bem como os queijos e os iogurtes, este último, produto recente da fábrica, que levava para os seus netos.

O ruído inconfundível do motor atroava a noite, vencendo mais depressa a neblina que hoje se tinha posto, do que as rodas da mota. Mas para ele a estrada não tinha segredos, conhecia-a como a palma da sua mão, tanto de dia como de noite. Sabia onde estavam os buracos mais profundos, sabia até onde era mais fácil encontrar algum coelho a atravessar a estrada, tantos que ele já tinha apanhado à mão, encandeados pela luz do farolim da mota. Hoje via-se menos, mas era uma noite igual a tantas outras.

Tinha ele acabado de passar o Pontão de Pau, pareceu-lhe ouvir um ruído que se sobrepunha ao barulho do motor. “Que raio?” zurzinou… “Mas que barulho é este?”.
Estava a chegar à entrada da Fazenda do Meio quando levou o maior susto da sua vida: vinda sabe-se lá de aonde, uma luz forte, cegante, começou a baixar do céu. Era uma luz branca, orlada de vermelho, acompanhada de uma pequena bola de luz, também branca, como uma lua. A luz deu duas voltas no ar, manteve-se um instante a pairar e, como que puxada por um elástico invisível, deu um solavanco e desapareceu a uma velocidade incrível no ar!

Ainda hoje Juvenal pensa nesta estranha luz, sempre que faz este caminho. No dia seguinte desfez-se da motorizada e fez um trato com um colega, camarada do tempo da tropa que mora numa aldeia próxima e que faz o mesmo turno na fábrica. Como o Tonho tem um automóvel, um velho Fiat 127, dividem as despesas e a companhia. É só uma questão do Tonho andar mais dois quilómetros. Quando lhe perguntaram o porquê desta atitude, ele ou cala-se ou diz que são ensimesmices dele! Mas nunca contou a ninguém o que tinha visto na estrada, junto ao muro da Fazenda do Meio. Também ninguém consegue explicar a razão das três figueiras que aí existiam, o dono entretanto já as cortou, nunca mais deram figos…